Gastronomia
Curadoria do Menuuh em Belo Horizonte mescla turismo, gastronomia, patrimônio cultural em experiências e reafirma “Ainda estamos aqui”
Você já percebeu que muitas vezes a gastronomia está dissociada do turismo? E que ambos são complementos um do outro? Poucos movimentos tenho visto pelo Brasil que estabeleça uma fusão genuína entre esses dois setores que movimentam a economia do país. As premiações gastronômicas pouco ou quase nada falam de turismo. Turismo Gastronômico ainda é algo que está preso no imaginário comum brasileiro como um tour rural, onde vai se conhecer o artesanato, pequenos produtores, lugares bucólicos. As vezes é necessário lembrar que não é só isso. Turistar por Belo Horizonte, a partir da curadoria do Menuuh, prova que a fusão de boa comida, arte e experiências pode ser um surpreendente caminho do turismo gastronômico brasileiro.
Viajar e comer bem têm tudo a ver. E por mais que os envolvidos saibam disso, pouco se apresentam dessa forma. Parece que falar “turismo gastronômico” diminui o conceito, o glamour, a posição. Talvez porque vemos diferentes o turismo pelo Brasil do turismo pela França, Itália, ou Peru, por exemplo. Nesses países, conhecidos pela boa gastronomia, fazer turismo gastronômico é sinônimo de status, de vanguarda. O Vale du Loire, a cidade de Bolonha ou a Plaza de las Armas tem muito em comum com muitas regiões brasileiras que podem e devem se apropriar dessa construção e criar novas narrativas para si, resgatando histórias, espaços, sabores, saberes.
O Menuuh
O Menuuh de Belo Horizonte é um tour com a curadoria da Belotur e Sebrae que resgata a história da própria cidade, repleta de arte, arquitetura, musicalidade e boa gastronomia. É uma ideia simples e com comprometimento com a trajetória de um lugar que tem como patrimônio os bares nas calçadas, a comida de panela, os encontros com os amigos para prosear, seu patrimônio urbanístico, os movimentos musicais, as fontes de saberes genuínos como o processo de fabricação da cachaça, dos queijos, hoje reconhecidos pela UNESCO com patrimônio imaterial da humanidade.
O Brasil dentro de Belo Horizonte
Um passeio por Belo Horizonte é uma viagem pelo Brasil, não fosse Brasília a capital federal, quem sabe o centro do país estaria por aqui. Isso porque Beagá tem sabor de nordeste, belezas cariocas, concretismo paulista, cotidiano centro-oestino, praias capixabas. Os momentos turi-gastronômicos vão acontecendo nos restaurantes, praças, prédios, mercados, bares que contam a história das ruas, das pessoas; resignificando regiões como o centro da cidade, o entorno do Mercado Central. Lembrando momentos únicos da nossa história como no passeio pela casa de Juscelino Kubistchek.
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O Munuuh nos leva a uma imersão cultural pela arte da liberdade na Casa Palma, por exemplo. A história do cirurgião que se tornou artista plástico vai despertando a curiosidade a cada obra, a cada manuscrito, como um Ser que na sua espiritualidade conseguiu enxergar sua missão, sua entrega por meio da arte. E ainda provoca o seu “eu artista”. Todos nós o temos! Mesclando pincéis, tecidos, dizeres. Um momento muito interessante num mundo tão tecnológico, midiático, digital, fugaz.
Outra vivência foi pela Chef Mariana Gontijo e seu macarrão com Tutu. Não imaginaria que uma comida que eu provava na infância seria a principal referência das festas de Reisado. Uma das festas que mais gostava de ver nas ruas do bairro onde nasci. Aqueles homens dançando com estandartes coloridos e adereços na cabeça fazem parte de um momento lúdico de minha vida. Foi lindo sentir a emoção do que é cozinhar como algo que se doa ao outro, satisfazendo-o, felicitando-o. A arte de cozinhar como um ritual capaz de contar muitas histórias. E o que é o legado da vida senão uma contação de histórias que ficam? A cozinha da chef Mariana, do Roça Grande é simples e deslumbrante por tudo isso.
Entre experiências inspiradoras de Beagá, uma me chamou bastante atenção pela devoção pela arquitetura, pelos patrimônios urbanísticos. O Museu das Reduções é uma obra prima para aqueles que com singela sensibilidade captam a importância do lugar que recriou prédios históricos para educar sobre patrimônio. Educação patrimonial é um luxo que precisa ser democratizado, principalmente num país que assistiu atônito seu principal acervo patrimonial ser depredado há inesquecíveis dois anos.
Turismo gastronômico em Belo Horizonte através do Menuuh
A curadoria do Menuuh conta com 19 vivências para que você se sinta “um local”, como quem sabe um almoço no Bar da Lora e provar o pescoço de peru; A galinhada repleta de ensinamentos sustentáveis no Paladino; ou um passeio pelo Mercado Central entre doces de leite da Melaço com queijos das 10 regiões produtoras de queijo artesanal do estado. As receitas do Copa Cozinha levam todos a mesa, uma calmaria em tempos de correrias. Ou ainda, uma peregrinação musical pela vida e obra dos integrantes do Clube da Esquina, movimento musical que inovou na musicalidade brasileira e representa tanto para nossa arte até hoje.
Não é nada revolucionário ter uma curadoria que nos guie por lugares interessantes e gastronômicos da cidade. Mas de certo, é um passo a mais na definição do Turismo Gastronômico que queremos. Diante de tamanhos desafios que muitas vezes nos colocam à margem da valorização da nossa própria história, precisamos olhar para nós mesmos, nossos pratos, nossos insumos, nosso patrimônio urbanístico, nossa arte e gastronomicamente dizermos para nós mesmos e para o mundo “Ainda estamos aqui”. Viva Beagá. Bravo, Menuuh, bravo!
Thiago Paes é colunista de Turismo & Gastronomia. Esteve em 35 países e quase todos os estados do Brasil provando os sabores do mundo. Está nas redes sociais como @paespelomundo. É apresentador no canal de TV Travel Box Brazil. Press: contato@paespelomundo.com.br
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