Gastronomia
Maior produtora de vinhos do mundo, a Itália apresenta vinícolas de 15 regiões e deseja se tornar líder no Brasil
Italianos consomem 35 litros de vinho por ano, enquanto brasileiros 2,2 litros, segundo International Organisation of Vine and Wine.

O que muitas vezes parece o enigmático “mundo do vinho”, quando bem traduzido, torna-se um universo interessante mesmo para amadores como eu que deseja apenas beber algo agradável para acompanhar (ou não) pratos incríveis. Aos poucos, aquelas narrativas inacessíveis entre especialistas e ultra conhecedores de absolutamente tudo que envolve borbulhas e aromas, vão abrindo espaço para os principais interessados, nós consumidores dessa bebida sagrada, que nem sempre entendemos a diferença entre perlage e calcários argilosos, mas temos interesses em provar a bebida dos deuses gregos (ou seriam bacos italianos?).
Esta semana na Wine South America assiti atento a aulas surpreendentes sobre vinícolas italianas e suas tradicionais regiões de vitivinicultura, didaticamente quebrando barreiras entre o inacessível e o pronto para beber, democraticamente.
O vinho ainda é cercado por uma aura de sofisticação que, mais do que valorizar a bebida, acaba por afastar muitos consumidores em potencial. Termos técnicos, rituais de degustação e uma linguagem excludente criam barreiras invisíveis que contribuem para a elitização do vinho. Mas será que precisa ser assim?
Denominação de Origem Controlada
Ao redor do mundo, o vinho é parte da vida cotidiana em diversas culturas. Na Itália, por exemplo, o consumo anual per capita ultrapassa os 35 litros, segundo dados da International Organisation of Vine and Wine (OIV). Na França, são mais de 40 litros por pessoa ao ano. Esses números refletem não apenas tradição, mas também um acesso mais amplo à bebida.
A Itália é a maior produtora de vinhos do mundo, com 41 milhões de hectolitros produzidos em 2024, representando 19% da produção mundial. São 341 Denominações de Origem Controlada, 545 variedades de uvas e 3 mil tipos de vinhos diferentes. Segundo a PGL Brasil, entre janeiro e outubro de 2024, os principais países exportadores de vinho para o Brasil foram Chile (41,9%), Argentina (19,4%), Portugal (17,1%) e Itália (7,9%).
Com apenas 2,2 litros consumidos por ano no Brasil em face de mais de 35 litros consumidos na Itália, o país entende bem que tornar o vinho um produto acessível ao consumidor brasileiro é fundamental para ser líder neste mercado.
Então, a que se deve a resistência em bebermos mais vinhos no Brasil? Alguns fatores podem ser hipoteticamente levantados como a redução da procura por bebidas alcoólicas em geral, mitos sobre vinhos serem apenas uma bebida de climas frios, ou até mesmo a elitização excessiva na apresentação de seus rótulos. Afinal, muitas vezes o discurso em torno do vinho está mais preocupado em exibir conhecimento do que em compartilhar prazer.
Na Wine South America, feira de negócios do vinho, realizada esta semana na cidade de Bento Gonçalves/RS, a ITA – (agência de promoção de empresas italianas no exterior) trouxe para o Brasil 23 vinícolas responsáveis pela produção de 256 rótulos entre tintos, brancos e espumantes de 15 das 20 regiões de vitivinicultura da Itália. Por meio de Master Classes divididas em 3 atos, os vinhos foram sendo apresentados a especialistas e convidados, pelo sommelier Gianni Tartari, com mais de 35 anos de experiência na área, como uma forma também de compartilhar um pouco da cultura enogastronômica e turismo na Itália.
Fundamental no turismo gastronômico mundial, o vinho faz parte de um elo que deveria estar cada vez mais unido em sua promoção: vinho, turismo, gastronomia. Discussão que infelizmente ainda faltou na feira desta semana, sem qualquer estande de gastronomia regional ou que enaltecesse o turismo enogastronômico.
Entre as regiões vinícolas da Itália que mais despertam o interesse dos brasileiros, algumas se destacam pela combinação entre qualidade e reconhecimento internacional. A Toscana, com vinhos como o Chianti e o Brunello di Montalcino, que costumam agradar tanto iniciantes quanto mais experientes. O Piemonte, por sua vez, é referência entre os tintos estruturados, como o Barolo e o Barbaresco, que ganham espaço nas adegas brasileiras. Já a Sicília vem chamando atenção com rótulos de bom custo-benefício e com uvas pouco conhecidas por aqui, como a Nero d’Avola e a Frappato.
Como um bom leigo e admirador de um bom turismo enogastronômico pelo mundo (são muitas degustações: entre vinícolas sul-africanas, portuguesas, húngaras, argentinas, brasileiras, entre outras), sinto-me a vontade para compartilhar com você, meu leitor fiel (ou não!), algumas das minhas percepções sobre alguns dos rótulos apresentados. Para alinharmos expectativas advirto que neste momento meu paladar é mais agradável para vinhos minerais e para os sabores mais gastronômicos. Aqui vão alguns rótulos que me chamaram atenção, e por quê.
Ato 1: da mineralidade à força do Sul
Do Antica Cantina Leonardi, um excelente espumante, bem seco, elaborado com 70% chardonnay e 30% Riesling Renano, o Dosage Zero. A vinícola familiar da região de Lazio, foi fundada em 1910, a mais antiga da região. Super elegante.
Um vinho bem gastronômico e também de solo de origem vulcânica, agora da região de Campânia, é o “Greco di Tufo DOCG, Oltre”. De uva 100% Greco. Um vinho que me pareceu bem mineral, mais encorpado, intenso, duradouro. A Viníciola fica a 700m acima do nível do mar. O DOCG significa: Denominação de Origem Controlada e Garantida.
Ato 2: Ilhas e vulcões
Do produtor Barberis, o espumante “Metodo Classico Passe-Partout Brut”, tem origem em Piemonte e Cortemilia. 80% Pinot Noir e 20% chardonnay. Sabe aquele aroma gostoso? Um espumante seco, mas macio, pouco residual do açúcar. Uma escolha bem brut!
Da Sardenha, o “Prendas Vermentino Di Sardenha DOC 2024”. Um vinho 100% da uva Vermentino. Persiste aquele gostinho na boca. Não se sente a ardência do álcool. A “Cantine di Dolianova” produz 4 milhões de garrasfas por ano.
Outro vinho que gostei muito na apresentação foi o “Etna Bianco DOC 2024 Tornatore”. Da região da Sicília e uvas 100% Caricante, foi elaborado a partir de vinhas cultivadas em terraços na encosta do vulcão. Leve, elegante, mineral, persistente. Fundada em 1865, a Tornatore está nas encostas férteis do Monte Etna, na Sicília, sul da Itália.
O “Refosco dal Peduncolo Rosso, 2022” é um vinho marcado pela mineralidade e acidez vibrante. O produtor, “Tacoli Asquini”, vinícola fundada em 1836, fica na Região de Friuli no nordeste da Itália. Região que trouxe vinhos surpreendentes para a degustação, e uma das surpresas para o mercado brasileiro. Aromático, Leve, persistente, elegante.
Talvez o vinho mais surpreendente dos 3 atos, o “Blasio Cannonau di Sardenha DOC Rosso, 2019”, é um blend de 90% Cannonau (famosa uva da Sardenha, mas também presente na França e Espanha “garnache”) e 10% de uvas tintas autóctones. Um vinho bem gastronômico, persistente, saboroso. Também do produtor “Cantini di Dolianova”.
Ato 3: territórios históricos
Dois vinhos excelentes para finalizar o ato 3: no primeiro, o “Gelso D’oro Nero Di Troia Puglia IGP”. A vinícola “Podere29” é uma boutique de vinhos na Puglia, sul da Itália. Dedicada a vinhos orgânicos e compromisso com sustentabilidade. O Gelso D’oro é 100% da uva Nero di Tróia. Macio, saboroso, acidez moderada, gastronômico, leve, final equilibrado, envolvente. Um dos meus preferidos.
E por fim, para o meu paladar, o “Amarone Della Valpolicella DOCG Barriques, 2018”, um vinho da região do Vêneto. Uva Corvina, Corvinone e Rondinella. Passa por processo de passificação Excelente! A “Zeni” é uma vinícola fundada em 1870.
Entre produtores e suas histórias admiráveis, entre rótulos elegantes e sabores intensos, fato é que o bom vinho é a composição de uma mesa, de um encontro, do prazer de estar entre amigos. Quando a gente bebe um vinho, a gente viaja pelas memórias e prova um pouco do que é cada lugar. O Terroir é o encontro da terra, da uva, do homem que produz, mas é também uma forma de mostrar ao mundo um pouco do que somos, por onde andamos. E não esqueça que o melhor vinho, é aquele que você gosta de beber. Um brinde!
Thiago Paes é colunista de turismo e gastronomia. Apresentador de TV no canal Travel Box Brazil. Está nas redes sociais como @paespelomundo. Press: contato@paespelomundo.com.br
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