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Turismo e Inovação

Turismo criativo – modismo ou tendência?

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Foto: prostooleh/ Freepik

Turismo Criativo é um termo cunhado por volta dos anos 2000 pelos professores Greg Richards e Crispin Reynolds. A partir de algumas de suas experiências em atividades consultivas, eles passaram a verificar que, ao propor e formatar atividades turísticas em que o turista tinha a oportunidade de se envolver de forma mais ativa, junto à atividades próprias de uma comunidade, logravam alcançar uma oferta de produtos turísticos mais interessante, diferenciada e que conseguia também envolver com mais facilidade e protagonismo, membros da comunidade local.

Assim, eles então conceituaram turismo criativo como “atividade turística que oferece aos visitantes a oportunidade de desenvolver seu potencial criativo enquanto participam ativamente de cursos, oficinas em torno de atividades características do destino eleito para o período de férias.

O turismo criativo na prática

Isto significa oportunizar ao turista ter uma ação mais protagonista do que meramente espectadora do território e das atividades em que se envolve. Nesta linha estão atividades em que se pode participar de oficinas de artesanato, de gastronomia, participar de roteiros em que podem ser aprendidos temas de fotografia, vídeo e/ou pintura, bem como, conhecer os bastidores de equipamentos culturais e participar da realização de alguma atividade cultural, realizar cursos e imersões artísticas, entre outros.

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Tais atividades permitem ainda que o turista possa de fato conhecer mais sobre o modo de vida das pessoas daquele destino, a partir do momento que, ao participar de atividades típicas daquela localidade, ele passa então a ter contato e proximidade com pessoas locais e neste encontro, tem a possibilidade de conhecer ainda mais os modos de vida do território, apresentado pelo olhar, vivência e experiência de quem, de fato, faz o dia a dia de um determinado lugar.

Foto: Carol Reis

Turismo criativo no Brasil

No Brasil, o termo passou a ser conhecido por volta de 2013/2014, porém, ainda em 2003, com o advento de criação do Ministério do Turismo, incorporou-se em projetos e atividades o termo produção associada ao turismo, que nada mais é, do que “considerar qualquer produção artesanal, industrial ou agropecuária, que detenha atributos naturais e/ou culturais de uma localidade, capazes de agregar valor ao produto turístico”.

Ou seja, ouso considerar que, mesmo sem saber, o turismo brasileiro também estava atento a tais transformações e buscou trazer para os destinos as possibilidades que poderiam ser criadas a partir de uma interação mais profunda entre turistas e comunidade local, tendo como pano de fundo as principais atividades do território.

Em paralelo a tais reflexões, também acontecia o avanço dos debates em torno da economia criativa e setores criativos, o que veio a reforçar ainda mais o termo turismo criativo, especialmente, vinculando a oferta de produtos turísticos pautados pelos setores criativos. Podemos dizer que neste cenário, palavras como criatividade, criativa, criativo, entraram na moda, assim como ocorreu com palavras como sustentável e sustentabilidade no final dos anos 90.

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Porém, independente do uso dos termos, o que pudemos, desde então, perceber, foi que o conceito de turismo criativo materializou o que já vinha acontecendo, primeiro de forma tímida, e agora, cada vez mais forte como tendência de comportamento e consumo do turista.

Do turismo tradicional ao turismo criativo

Se antes, víamos a oferta de pacotes turísticos que mais pareciam uma maratona: 12 países em 15 dias, 7 cidades em 5 dias, passamos a identificar a procura, de forma mais intensa, por menos destinos, pelo mesmo período, mas que permitisse de fato, conhecer com mais calma e tranquilidade o lugar, do que apenas rechear os álbuns de fotos, virtuais ou não, com retratos de pontos turísticos e nenhuma outra lembrança, história ou informação adicional.

Neste sentido, é preciso corroborar a reflexão feita pela pesquisadora em turismo criativo, Elena Paschinger, de que o que vem a diferenciar as demandas do turista tradicional para o turista criativo é que, o primeiro, ainda busca por “sightseeing”, ou seja, busca ver as paisagens, estar nos lugares, mas não necessariamente se envolve com o território. O que é exatamente a busca do turista criativo, que procura pelo “life seeing”, ou seja, pelo modo de vida, pelas pessoas, mas sem esquecer ou deixar de também vivenciar as atividades tradicionais.

Para exemplificar, é como se o turista tradicional ao visitar Madri, assistisse a uma apresentação de flamenco, e o turista criativo, fosse além. Ele vai se interessar mais por realizar uma aula de flamenco, com um professor local, de preferência em um teatro onde as apresentações aconteciam e em que é possível conhecer a história por trás da música, da dança, dos instrumentos, da vestimenta, e quem sabe, ter até mesmo a oportunidade de participar de uma breve apresentação. Ao retornar ao seu destino, com certeza, além das fotos da dança, ele terá ainda muito o que contar e lembranças que serão únicas.

Uma oportunidade de inovação

Se compreendemos que a matéria-prima para desenvolvimento de produtos, roteiros e pacotes pautados pelo turismo criativo são os setores criativos, podemos considerar que o turismo criativo se configura como uma oportunidade de inovação, tanto para o setor turístico, como para os diversos destinos turísticos já que se confirma como uma possibilidade de diversificar a oferta turística, envolver a comunidade local e outros perfis de atores para a atividade turística, bem como, ter melhores condições de competição junto ao mercado.

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Isso porque, ao destacarmos produtos de turismo criativo vinculados aos setores criativos locais e aos modos de fazer locais, não estamos falando de uma prática pasteurizada ou massificada, mas sim, produtos realmente vinculados ao território, aos diferenciais daquele destino. Por exemplo, os vários destinos podem ofertar uma oficina de fotografia, mas, em cada destino ela acontecerá de forma única, isso porque, por mais que as técnicas sejam as mesmas, a luz, a paisagem, a história de cada um, terá uma forma peculiar de ser contada.

Como desenvolver o turismo criativo?

Ouso dizer que desenvolver turismo criativo é uma maneira de desenvolver inovação social, e para tal, são necessárias algumas premissas:

  • Storytelling: Turismo criativo tem intrínseco à sua atividade a habilidade de storytelling, tão em voga em tantos outros setores e processos de experiência do consumidor, em que a forma como eu compartilho uma história, conto uma situação ou ensino uma atividade faz toda a diferença.
  • Cocriação: A experiência de turismo criativo é criada, assim como toda a experiência turística, no momento em que se consome, porém, no caso desta forma de praticar turismo, o envolvimento, a troca, a oportunidade de encontro entre turista e comunidade local, dão o tom e trazem o diferencial para a experiência.
  • Identidade: Para fazer sentido, a oferta de turismo criativo tem que estar vinculada às características do destino. Aquilo que é reconhecidamente um diferencial para a comunidade.
  • Participação e envolvimento cidadão: Não se faz turismo criativo sem gente, sem as pessoas para contarem suas histórias, sua forma de se relacionar com o território e com suas riquezas.

Uma nova forma de pensar turismo

O turismo criativo, na minha avaliação, não se configura como um novo segmento de turismo, mas uma maneira de pensar, promover e praticar a atividade turística. Ocasiona o diálogo com outros segmentos turísticos como o cultural, negócios, ecoturismo, rural, e se torna também uma ferramenta para o desenvolvimento do turismo de base comunitária.

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Pode ser também responsável por desenvolver novas oportunidades, seja para destinos de pequeno, médio ou grande porte. Destinos de pequeno porte tem no turismo criativo a chance de se diferenciar dos demais e de competir efetivamente no mercado global, enquanto que, para destinos de médio e grande porte, podem ser uma ferramenta de renovação da sua oferta, de forma que siga competindo no mercado e fidelizando turistas.

Turismo criativo como objeto de transformação

Para finalizar, reconheço que, pensar turismo criativo, é relembrar também Confúcio, filósofo e pensador chinês que viveu entre 552 a.C e 489 a.C. Ele dizia “Diga-me algo e esquecerei, ensina-me algo e eu lembrarei, me faça participar de algo e eu aprenderei!” Ou seja, o turismo criativo pode de fato ser uma forma de praticar turismo em que, para além da geração de riqueza, existe a possibilidade real de transformação, de aproximação, de criar ocasiões para que pessoas totalmente diferentes, seja pelo seu local de origem, seja pela sua cultura, possam se conhecer e quebrar possíveis preconceitos e estereótipos.

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Assim, se turismo por si só, já é a meu ver, uma ferramenta de transformação, o turismo criativo é a confirmação de que a atividade em si tem um papel crucial para promover a paz e contribuir para um mundo cada vez melhor.

Se você tem interesse em conhecer mais sobre turismo criativo, sugiro conhecer a Creative Tourism Network, o IGCAT e a Recria. Com certeza, você encontrará muito material bacana, e claro, oportunidades para se tornar, se ainda não for, um turista criativo!

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.