Cultura
O estado do Pará, eu e a síndrome do coentro
Descubra uma plantinha com poderoso sabor, presente na culinária paraense.
A minha vida profissional já me levou em inúmeros locais principalmente em Minas Gerais, onde atuo com mais frequência nas consultorias socioambientais. E, desde 2020, tenho frequentado o belíssimo estado do Pará.
Na esplendorosa região Norte do Brasil, frequentando os assentamentos e suas vilas rurais, me impressionei ao conhecer a beleza estética que se transformou a imponente cava que contou parte da história do garimpo de Serra Pelada e convivi com situações inusitadas como o dia em que em uma reunião de comunidade em uma ensolarada tarde de sábado, conheci um maranhense, mateiro, que tinha um portentoso urubu de estimação, que o acompanhava no ombro por onde ia.
No Pará, como geógrafo me deslumbrei rapidamente com a belíssima paisagem à margem das estradas, com a riqueza mineral da região de Carajás, com a leveza e beleza de uma gente simples e hospitaleira da região turística do Araguaia, que acolhe muito bem aos visitantes e faz questão de valorizar suas tradições, a cultura popular paraense, mas especialmente a diversa gastronomia típica do estado e toda diversidade de tons de verde da Amazônia brasileira.
Novos sabores
Em um primeiro momento, embevecido com tantas novidades, paralelamente às minhas atribuições profissionais por lá, que me aproximaram muito das comunidades onde atuo, fui aqui e acolá, experimentando os sabores típicos, a variedade de pratos, cheiros e sabores um tanto distantes da minha rotina alimentar, mas que mereceram a atenção da minha curiosidade palatável!
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Como bom mineiro, gosto muito de um fogão a lenha recheado de panelas e os frequento corriqueiramente! No Pará, rapidamente meu apurado paladar me fez perceber, que recorrentemente sentia um gosto forte e muito presente na boa maioria dos pratos, que consumia por lá!
Que tempero é esse?
No começo, achava interessante um suposto tempero, com tanta presença nos pratos. Aos poucos fui percebendo, que me irritava e desafiava ao mesmo tempo, a insistência de um sabor exótico, para o meu gosto, que atrapalhava o sabor de literalmente tudo que punha na boca.
Cheguei a ficar intrigado, cheirando tudo que ia consumir, porque não tinha mais paz, já que aquele cheiro forte, me sinalizava que se desse uma garfada, estaria de frente com aquele gosto teimoso, que roubava a graça de simplesmente tudo que encontrava nos coloridos e variados buffets.
O atípico, era que, por conta do insistente uso de alguma coisa que ainda não tinha detectado o que era e que para o meu paladar estragava toda a beleza da culinária local, fui aos poucos ficando limitado com as opções para as minhas refeições e certamente, precisa desvendar aquele mistério.
Uma vez desafiado, a cada ida ao Pará e estas acontecem mensalmente, iniciei uma saga com uma investigação criteriosa para descobrir, afinal de contas, qual era o segredo daquele sabor, que eliminava inevitavelmente, o sabor real de absolutamente tudo!
Se comia uma singela pipoca, o sabor estava lá, um salgado na esquina e me decepcionava com aquele gosto do tempero se mostrando, um simples feijão com arroz e aquele tormento desnecessário prevalecia, um pão com manteiga e o cheiro insistente me arruinava.
A descoberta do coentro
Já neurótico, comecei a remexer cuidadosamente tudo antes de consumir. Pesquisei atentamente toda a composição dos pratos que ousava conhecer, até que com uma minuciosa e paciente separação de ingredientes, detectei a presença de uma folhinha verde, graúda e com cheiro muito acentuado, já que aquele perfume era gratuitamente antipatizado pelo meu olfato mineiro.
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Naquele momento, descobri que ao conviver com a cozinha paraense eu estava sofrendo da “Síndrome do Coentro”!
Um misto de satisfação pela dolorosa descoberta e ao mesmo tempo, uma lamentável constatação, já que a força daquela erva, insistentemente usada na cozinha paraense, extirpava qualquer possibilidade de sentir o gosto original dos pratos regionais.
Como um estudioso da cultura brasileira, até tentei me adaptar àquele hábito regional, mas realmente isso para mim se tornou um verdadeiro sofrimento.
Recorri ao Google e descobri que o Coentro é o tal “Eryngium foetidum”, eríngio, ou coentro-bravo e em algumas variações, também conhecida pelo nome chicória do Pará, na região norte do Brasil, ou chamado de coentro largo na Bahia e é uma planta perene, de hábito herbáceo, nativa das regiões tropicais das Américas. Segundo consta, as folhas do coentro têm aroma refrescante e sabor marcante e o coentro combina bem com peixes, frutos do mar, frango, legumes e também pode ser ingrediente de infusões.
No meu já contaminado subconsciente, sentia o poder do “Eryngium foetidum”, em tudo que punha na boca e isso me fez compreender que convivia com a Síndrome do Coentro!
Hoje admito, sou um inimigo declarado da especiaria e lamento muito que esta síndrome esteja incutida no meu cérebro, já que isto me limita a aprofundar na conhecida culinária Paraense.
Viva a diversidade! E o coentro!
Exageros a parte e com um profundo respeito à cultura e à gastronomia paraense, continuo frequentando mensalmente o estado, me encantando cada vez mais com a diversidade cultural tão presente nas comunidades que convivo e compreendendo cada vez mais a dimensão e a riqueza da cultura brasileira.
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É bom ressaltar, que espertamente, já articulo com os chefs e com as simpáticas cozinheiras onde frequento e me apresento como sofredor da síndrome, encontro sempre o acolhimento à minha limitação e consigo sempre uma comidinha caseira, que mata minha fome e garantidamente me apetece!
Viva o Brasil e viva a diversidade dos sabores brasileiros!
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.